terça-feira, 19 de agosto de 2008

Teatro do Oprimido: Mundialização e Estética

Segundo o Centro de Teatro do Oprimido do Rio de Janeiro, existem mais de 50 países que já usam como método o teatro do oprimido. É o caso de Portugal, nomeadamente em Braga, ainda que na infância, com a Nova Comédia Bracarense; no Porto, com os cursos de Teatro do Oprimido na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto e em Lisboa, com o GTO Lx (Grupo de Teatro do Oprimido de Lisboa). Este último tem vindo, actualmente, a desenvolver teatro para bairros sociais, como o da Arrentela, escolas e até para a ilha de S. Miguel nos Açores. Usam como suporte o conceito de empowerment que se poderá traduzir em linhas gerais como a suscitação de poder no povo que permita a participação e intervenção na sociedade para a concretização da mudança. Neste caso, trata-se de possibilitar aos habitantes de bairros, aos estudantes das escolas e aos moradores da ilha de S. Miguel um comprometimento para com a satisfação das expectativas dos espectactores.

Segundo Augusto Boal, outros focos importantes no mundo de teatro do oprimido estão concentrados em países com culturas tão diversas como em África, cuja performance se centra mais no ritmo, em França, mais focada para a oratória, e na Índia, mais debruçada no movimento e na imagem.

Foi pegando nesta mistura mundial que Augusto Boal lançou em Londres o livro Aesthetics of the Oppressed (A Estética do Oprimido) da editora Routledge. Trata-se da mais recente pesquisa de Augusto Boal e da equipa do CTO-Rio (Centro de Teatro do Oprimido do Rio de Janeiro).

Considera a obra de que o ser humano comum é expansivo, capaz de ir sempre mais além das suas capacidades, e portanto será sempre melhor do que realmente pensa que é, ou seja, é capaz de realizar mais do que realmente faz. Tendo esta ideia por base, pretende-se que os espectactores transcendam a sua condição de actor/personagem para uma contextualização estética de compreensão do mundo. Ou seja, o actor não deve ser apenas uma situação isolada em palco, mas uma personagem que se ambienta e atenta ao mundo actual. Por exemplo, um espectactor enquanto representa uma situação de opressão ou de oprimido deve ter em conta o que leva o opressor a oprimir reconhecendo a opressão enquanto tal, a sua História, as suas ferramentas, os seus métodos, os seus propósitos, as suas consequências e os seus contextos.

Assim, ficamos como constituintes de uma peça de teatro: 1) o actor, o que representa, 2) o director, o que dirige a acção, 3) os figurinos, os que se adequam ao ambiente, 4) o dramaturgo o que escreve a acção e 5) o ser humano o que recria e metaforiza a realidade em imagem.

O objectivo é que o ser humano se descubra e que se aproprie do que originalmente é seu para recriar o real e projectar um futuro.

Para ajudar cada um a descobrir essa potência e a capacidade transformadora, promovem-se actividades artísticas em quatro eixos:

PALAVRA: falada/escrita: os participantes produzem poesias, poemas, reflexões: "o que mais me impressionou" (relato sobre situações que impressionam os participantes no dia a dia) "declaração de identidade" (carta para algum interlocutor - conhecido ou não - com descrição do remetente), artigos, contos, além de textos dos espectáculos;

IMAGEM: actividades de artes plásticas, com produção de desenhos, figuras, criação de esculturas a partir de objectos encontrados; fotografia - análise do mundo que nos cerca e criação de cenas e espectáculos.

SOM: sonoridade: pesquisa sonora, descoberta do potencial da voz, instrumentos - existentes/inventados, música e criação de dança a partir de movimentos da vida quotidiana.

ÉTICA: diálogos/conversação: promoção de encontros com especialistas e promoção de centros de estudos de: filosofia, história, ecologia, economia, política e vida social.

Em jeito de conclusão, podemos dizer que a Estética do Oprimido é uma forma de reconhecimento do contexto mundial com todas as suas variedades culturais postas em teatro, objectivando uma participação, intervenção e compromisso dos espectactores para a transformação, para a mudança, para um mundo melhor.

Pedro Kayak

2 comentários:

Miguel Marado - NCB disse...

Mais um texto do Kayak a ilucidar-nos acerca do Teatro do Oprimido e a preparar-nos para o nosso próximo0 espectáculo neste género teatral.

Espero que apreciem o esforço e não se esqueçam de, daqui a pouco, aparecer para ver como é...

Bom texto!

Marado

José Faria disse...

O teatro da vida do dia a dia, da justiça e injustiça social, mostra-se, declara-se, revolta-se e exprime-se no palco do povo... do seu associativismo!
Parabéns!
Faria do Zémaiato