quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Ficção na TV

Como devem notar os caros leitores, tenho uma relação de alguma amizade, ou talvez de amor/ódio, com a televisão. Não sou apenas fã de teatro, ou só do teatro em si, como forma de expressão e arte performativa. Sou deveras fã de representação, gosto de actuar e de ver boas performances, criativas, genuínas, de qualidade, seja em que suporte for. Assim, apesar de dar preferência ao fenómeno teatral, não descuro a “sétima arte” e também uma sua prima, considerada menos “nobre”, a ficção televisiva.

No que respeita a esta vertente, ao pequeno ecrã, considero-me de facto um pouco um conhecedor, uma espécie de pequeno “especialista”, isto porque sei mais do que seria natural, e talvez saudável, saber. Desde a ficção britânica (como “Blackadder” e “Royle Family”), passando pelas grandes produções americanas (como “Lost”, “House” e “E.R.”), nunca olvidando a comédia (com um clássico como “Seinfeld” ou um recente sucesso, como “The King of Queens”), ou as séries de culto (como “Oz” ou o mítico “X-Files”), etc, conheço de tudo.

Aprecio os critérios, alguns artistas, alguns autores… Sobretudo aprecio o maior cuidado que é tido, com elencos mais capazes, mais curtos, com mais tempo para trabalhar, sem esquecer que além de tempo têm sobretudo dinheiro, muito dinheiro.

Mais do que isso, aprecio a nossa ficção, as nossas séries. Gosto do “Gato Fedorento”, esse fenómeno que soube crescer sempre e espero que dure muito; já apreciei muito o hoje desastroso Herman José, desde o “Tal Canal” até há bem pouco; gostei imenso do ingloriamente desaparecido “Programa da Maria”, bem como dos maiores sucessos de Miguel Guilherme, “O Fura Vidas” e, hoje, “Conta-me como foi”, especialmente o primeiro.

O que penso em relação a isto é que podia gostar de mais, podia ter um pouco mais quantidade, já que em relação à qualidade não existem grandes dúvidas. Isto, claro, mais uma vez, em detrimento da enorme quantidade de ficção sem interesse e de “talk-shows” baratos, que hoje pululam na televisão portuguesa. Mais uma vez aprecio os critérios, os artistas, e todas as condições que são dadas, normalmente, a estes programas que aparecem semanalmente, ao invés da reprodução diária de textos sem história, com péssimos diálogos, representações baratas, mal preparadas e sem ponta de talento, com uma cara bonita para distrair as mentes mais carentes de sossego.

Além de gostar que houvesse mais ficção sob a forma de série televisiva com marca nacional, não me importava, já agora, que a boa, por vezes excelente, televisão de produção estrangeira não fosse relegada para horas impróprias ou para canais de televisão por cabo, com repetições até ao absurdo.

Às vezes conhecem-se grandes programas em noites de insónia, ao chegar dum “café” mais tardio, ou talvez com o choro de uma criança mais irrequieta. Talvez seja esse o objectivo das nossas televisões, o presentear-nos com belos espectáculos nos momentos mais incómodos, no silêncio da noite. No fundo, fazer-nos valorizar os pequenos prazeres da vida, aqueles que só surgem de longe a longe.

Melhores produções, melhores e mais preparados textos, melhores e mais talentosos actores portugueses é o que de facto desejava ver, para ver se volto a ligar algum dos primeiros canais da grelha sem ser só para ver uma bola aos saltos.

Miguel Marado

terça-feira, 21 de agosto de 2007

Teatro na TV

É óptimo chegar à noitinha, talvez numa quinta-feira a seguir ao Telejornal, e ver, na televisão, uma peça de teatro, representada por alguns dos nossos melhores actores ou por jovens promessas, ou mesmo, mais raramente, por algumas boas companhias de teatro de amadores, como é o caso da Nova Comédia Bracarense, com boa encenação, temas ricos e diversificados, autênticas maravilhas sem sair de casa.

Sim, é falso. Não há qualquer género de teatro na televisão. Bem, pelo menos teatro, teatro, não há. Há frutos adocicados que regurgitam fenómenos de assistência e audiências, mas nenhuma actividade digna de corujas e não de seres humanos se pode denominar “arte”.

A minha mentira do primeiro parágrafo não surge por causa do 1 de Abril, mas pela manifesta necessidade de poder proferir aquelas palavras com confiança e autenticidade. Por muito que possa admirar a alguns, não sou grande adepto da telenovela e da porcaria da volta a Portugal em parvoíce (“Há Volta”?); não gosto da Júlia Pinheiro e da Fátima Lopes, nem da grande senhora da TVI, Manuel Luís Goucha; não me fascino com a Maddie McCann; não me emociono com “Os Malucos do Riso”, esse hino à piada parva.

Não sei porquê, mas penso que muita gente, ou pelo menos gente de alguma cultura, preferiria ver uma peça de teatro e menos uma hora e meia de “aceleras” de duas rodas, ou de modelos a retratar mentecaptos 6 ou 7 anos mais novos, ou de “pensadores dos tempos modernos” a esmiuçar a vida da Lili Caneças ao vivo toda a tarde, ou pior: a explorar as tragédias de vida de alguns prostitutos do mediatismo.

Estou farto de ver o serviço público e chafurdar na lama da luta pelas audiências, com programas de banalidades e reconstituições de telenovelas com 120 anos e nenhuma qualidade, em aspecto algum. Se a falta de noção da realidade é minha, então expliquem-me porquê: o teatro fica caro de transmitir na televisão? Não, pois claro. As audiências seriam piores que as da “fantabulástica” “Floribella”? Penso que seria difícil. Os patrocinadores não ficariam felizes? Os que patrocinam o teatro não se incomodam muito. As pessoas manifestar-se-iam contra o teatro? Não tantas como as que detestam as mesmas coisas que abomino e já referi. A cultura mata, ou magoa sequer? Talvez os ignóbeis se sintam doridos, mas isso é inerente à sua condição.

Se não houvesse qualidade e valor nas nossas peças, nos nossos encenadores e actores (e não falo só dos fenómenos de popularidade e populismo, inerentes à generalização da sua presença nas múltiplas novelas que são produzidas), talvez se justificasse, mas não é isso que acontece. Se não houvesse lugar nas grelhas, ainda assim me queixaria, mas quando há repetições de novelas com 30 anos e adaptação de personagens com dois “l” no nome, penso que, de facto, há espaço até para ver imagens de satélite meia hora por dia.

Peço, por favor ao nosso país e sociedade, mais qualidade em geral nas programações dos nossos canais, que pagamos e muito, com as toneladas de publicidade que invadem os nossos olhos e chegam a influenciar a nossa criatividade. Peço um pouco de teatro, com regularidade e a horas decentes, para que a comum expressão “nunca fui ao teatro” possa ter um significado menos pesado.

Mas, por favor, não vão buscar os actores e argumentistas às novelas que já temos, porque para isso vejo o Cândido Barbosa pedalar, enquanto choro o teatro nacional.

Miguel Marado

terça-feira, 14 de agosto de 2007

Férias

Férias… Aquele momento mágico que nos faz aspirar por descanso e diversão, a pausa de todos aqueles trabalhos e fatigantes projectos, aquela altura do ano pela qual toda gente espera, ou quase toda, pois é preciso fazer sempre uma pausa...

Será mesmo sempre? Afinal de contas, com a chegada destas férias das aulas, chegaram também umas mini-férias da NCB, e sinceramente, dessas férias eu não gosto! Lá se foram os ensaios, a galhofa de estarmos todos juntos, as gargalhadas junto ao palco, o improviso feito em palco... Está tudo em “stand-by” para que chegue o próximo ciclo de aventuras.

Nunca pensei que viesse a haver umas férias de que eu não gostasse, mas mais uma vez o teatro trouxe-me uma experiência nova. É que agora, deixei de gostar de dedicar as minhas férias ao Deus Ócio e à Deusa Preguiça. Preferia muito mais estar a trabalhar para vos trazer algo novo a palco. Não que não o esteja a fazer, pois de momento, como já sabem, temos todos um pouco da nossa energia voltada para a escrita, mas não é suficiente, nunca chega. Estar em palco é algo transcendente e não pode nunca ser substituído por qualquer outra actividade, nem nunca pode ser suplantada por algo tão desprovido de significado como as férias.

Mas não se enganem, claro que gosto da piscina, da praia e de sair com os amigos, mas o teatro não invalidaria isso e traria um pouco de conteúdo cultural a estas minhas férias: sinto falta dos vossos olhos em mim, da vossa atenção, dos murmurinhos que se ouvem, do nervosismo que o palco provoca… Estou farto de “férias teatrais”!

Embora este texto me tenha posto em contacto com o teatro, e me tenha deixado nostálgico nestes odiosos minutos que passo de teclado na mão em frente dum monitor, não chega; e falar para vocês que gostam de teatro e querem ver teatro, apenas me faz odiar mais um pouco estas férias. Por isso me despeço com um “até breve”, porque qualquer quantidade de tempo superior a “breve” é, sem dúvida, tempo a mais.

Até Breve!

Nuno Diogo Neto Ferreira

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

Eu?

Lembro-me de quando eu era criança, mas não me consigo lembrar se tinha um amigo imaginário…

Faz hoje alguns dias, não consigo precisar bem quantos, estava eu não sei bem onde, não me recordo do sítio, quando me lembrei de algo. Na frase que acabei de escrever há verbos conjugados na primeira pessoa do singular, referindo-se, desta forma, bem como os elementos “eu” e “me”, a mim mesma. Mesmo não podendo contextualizar o surgimento desta ideia no tempo e no espaço, sei que fui eu quem a teve, recordo-me, e isso, acreditem, tem o seu valor.

Do geral para o particular: existem patologias, existem psicopatologias e existem perturbações dissociativas. Assim, é possível definir estas últimas como “disfunções das funções normalmente integradas da consciência, memória, identidade e percepção” que “podem ser súbitas, graduais, transitórias ou crónicas” (DSM-IV-TR, 2002, a pseudo-bíblia dos psicólogos). Dissociamos quando nos escapamos a nós mesmos, estando este conceito associado, por exemplo, ao muito popularizado “múltipla personalidade”. Estão-me a seguir? Não, não estou a dissociar...O que é que isto tem a ver com teatro? Voltemos, então, à minha ideia.

Quando entrei para a NCB, que é como quem diz quando comecei a fazer teatro, que é como quem diz quando me iniciei na arte da representação, ouvia dizer que, aquando em cima de um palco, o actor deixa de se sentir ele mesmo, pensando, agindo e sentindo como a personagem que naquele momento representa. No meu caso, confesso, só entendi isto bastante mais tarde...quase tarde demais. Ao início, centrava-me em memorizar o texto, palavrinha a palavrinha, as indicações cénicas e mais pequenas movimentações, e concentrava-me nisso, para nada falhar, para não me perder...Perdi-me! Até que um dia, sem que tivesse entendido o que tinha mudado, foi diferente. Em vez de me impingir tudo o que a Carolina – assim se chamava a personagem – dizia e fazia, comecei a conhecê-la, aos poucos. Quando dei por mim, era possível vivê-la, sê-la, quase livremente; era possível jogar xadrez em palco sem ter as jogadas combinadas. Por momentos, julgo que era capaz de responder a muitas perguntas sobre ela, na primeira pessoa. Voltamos à minha ideia...

O que pensei centrou-se/ centra-se, então, na possível relação existente entre o acto de representar e a dissociação. Vejamos... Estou certa de que representar não é nenhuma doença, não me interpretem mal, no entanto, já experimentei a sensação de, por momentos, no decorrer de uma peça, “deixar de ser eu”. Mais profundamente ainda, no final da mesma peça não podia jurar ter pronunciado completas todas as falas, apenas sabendo que tinha passado, acabado, e que eu tinha gostado da experiência. Perguntava-me: estará o exercício teatral associado (ou dissociado) a um outro que tem por objectivo a desintegração da identidade, percepção, memória e consciência? Se sim, será este um assunto súbito, gradual, transitório ou crónico? Já ouvi relatar que há pessoas que treinam a dissociação, como é o caso, por exemplo, das que sofreram um trauma e/ ou das que são sujeitas constantemente, por alguma razão, a um forte sofrimento físico. Dissociarão os actores? Continuam-me a seguir? Chega de perguntas… Aliás, não espero respostas, apenas opiniões… discussão! Obrigada pela vossa atenção!

Já agora, o que terão os amigos imaginários a ver com tudo isto?

sábado, 4 de agosto de 2007

O despertar de novos projectos

Com o aproximar de um novo ano de trabalho, novos projectos surgem também.

Encontrando-se, de momento, o grupo de teatro de férias (à excepção de improvisos esporádicos), tal não implica que os novos projectos não estejam a ser delineados e desenvolvidos. Já em Outubro, daremos início a uma nova série de espectáculos que, mais precisamente, serão compostos por sketches que giram em torno de diversos temas actuais e que visam caricaturar os partidos políticos, corpo associativo e filiado, tal como da sociedade em geral. A sociedade bracarense será também um dos temas escolhidos para a realização de um espectáculo, com o intuito de mostrar aquilo que de mal julgamos haver na nossa cidade e na sua liderança política.

Na fase de desenvolvimento deste novo projecto há um apelo à nossa imaginação, criatividade e também nos reportamos à realidade, para que, da junção dos mesmos, resultem textos e peças bastante divertidos e com um carácter que urge ser imposto, o da crítica, o da intervenção que, no nosso entender é bastante necessário, pois confrontamo–nos com uma actualidade demasiado elitista e contraditória nos que respeita á defesa dos cidadãos (que deveria ser o objectivo principal do Estado) e dos valores defendidos “quase” em comum pela maioria dos partidos que continuam a afirmar–se de certas posições ideológicas, não evidenciadas nas suas acções.

Achamos que o teatro tem cada vez mais que apelar à consciência dos cidadãos, não lhe atribuindo somente uma vertente lúdica mas também de intervenção.

O nosso novo projecto surge em prol de uma sociedade informada por meios divertidos de o fazer. Sem desvendar, nem abrir “as cortinas”, esperamos por vocês para verem o resultado de mais um trabalho da NCB que, e passe o cliché, é feita por nós, por vocês e para vocês.

Joana Barroso – NCB