quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Psico...drama

Frequento o Mestrado Integrado em Psicologia da Saúde da Universidade do Minho e, no corrente semestre, participei num projecto de investigação cujo assunto versa a relação entre Adversidade, Trauma e Saúde, no âmbito do qual entrevistei algumas reclusas do Estabelecimento Prisional de Santa Cruz do Bispo. Dias depois, vi anunciar uma reportagem que viria a ser transmitida na RTP acerca de uma peça de teatro representada por algumas das reclusas da mesma instituição, com a participação de Sónia Araújo. Foi este acaso o responsável pelo tema do texto que apresento hoje...Psicodrama.

O Teatro da Espontaneidade, aberto por J. Moreno, em Viena, desafiava actores voluntários a improvisar sobre notícias publicadas na imprensa, no que se denominava técnica do “jornal vivo”. Neste contexto, no ano de 1923, o mesmo autor inventou a Psicodrama – forma de realizar psicoterapia, individualmente ou em grupo, que se centrava, num primeiro momento, nos conflitos da vida privada na idade adulta, tais como a incompatibilidade de feitios, o ciúme ou mesmo o divórcio, tendo sido extendida, posteriormente, a crianças, ao treino de papéis sociais e profissionais (jogo de papéis) e a diversos grupos sociais (sociodrama). A ideia passa pela representação, por parte dos participantes, de cenas quotidianas (passadas, presentes ou antecipadas) de conflito, tendo em conta a história de vida de cada um deles. A técnica em questão exige, para além de um espaço, espontaneidade por parte dos actores, bem como “a presença de um público funcionando como caixa de ressonância dos afectos vividos em cena” (Anzieu, 2001), tudo isto supervisionado por um director de cena ou encenador, entre outros aspectos. A catarse (directa - dos actores - e indirecta - dos espectadores) é, para fundadores, crentes e seguidores desta forma de terapia, a responsável pela sua eficácia, visto que o(s) paciente(s)/actore(s) externaliza(m) emoções e afectos supostamente reprimidos de acontecimentos anteriores. Este método ramificou em diversas variantes que divergem consoante os sujeitos, problemas apresentados e teorias dos psicodramatistas, psicoterapeutas ou psicodramaturgos. Alvo de muita controvérsia, a Psicodrama é (mais) um dos assuntos polémicos da ciência psicológica, em geral, da sua relação com a arte, em particular.

Deixo-vos, hoje, com esta “notinha”, na esperança de ter contribuido para o bom trabalho que tem sido praticado neste blog, de ter sido pertinente, no fundo. Não posso terminar sem salvaguardar que este texto não consiste, de todo, numa tentativa de definir Psicodrama na sua totalidade, muito menos de explorar o tema. Este texto tenta ser isto mesmo, uma “notinha”, que espero significar algo para vós, seja lá o que for...Quanto a mim, apetece-me agradecer à NCB e a este blog por mais esta oportunidade, por ter aprendido mais qualquer “coisinha”...Talvez fosse interessante voltar a entrevistar aquelas senhoras, perceber o que o teatro fez por elas...Quem sabe um dia! Obrigada pela vossa atenção!

Joana Raquel Antunes

2 comentários:

Pedro Mendes disse...

Sem descartar muitos posts que por aqui já li, este foi sem dúvida um dos que gostei mais pela originalidade, pela abertura a novas experiências e pela vontade em partilhar algo tão importante como o legado do Moreno, autor que aprecio muito, e que será exposto no workshop Teatro do Oprimido segundo a interpretação e prespectiva de Augusto Boal que também dá muita importância ao teatro como terapia como iremos ver no Teatro Jornal (Jornal vivo), e no Arco-Iris do Desejo (troca de papeis, entre outros. Parabéns pelo post.

Miguel Marado - NCB disse...

Mais um excelente e pertinente texto da que tem vindo a ser, - quanto a mim, pelo menos -, a melhor autora deste nosso site.

De resto aborda um tema que revela o que o teatro tem de vivo, de mais democrático no acesso e de mais criativo na abordagem, apesar de ser óbviamente - aliás, conforme mencionado - questionável.

Acaba por ser uma temática que introduz um futuro workshop que está a ser organizado pelo Pedro Kayak (que comentou antes de mim), sem se pretender que o fosse. Coincidências...

Marado