terça-feira, 14 de julho de 2009

Se pudesses ter um mentor, quem seria?

Confesso que escrever o texto que se segue não foi a tarefa mais fácil com que me deparei. A página branca e o cursor intermitente assustaram-me, ao passo que me desafiavam, durante aproximadamente uma hora. Nessa hora, reli textos de colegas e amigos, pensei em tudo o que o teatro foi para mim enquanto espectadora e reflecti no que com ele cresci no meu pequeno percurso enquanto actriz. No final dessa hora a página permanecia branca e o cursor continuava na sua brincadeira despreocupada, aparecendo e desaparecendo, quase como que marcando o ritmo dos meus pensamentos e da minha indecisão relativamente ao que escrever.

O teatro tem vindo a ser uma constante na minha vida há já alguns anos. Nove, talvez. Segui sempre de perto o percurso daquele que introduziu o teatro na minha vida, o meu irmão, Miguel Marado. Desde peças na escola básica, às produções da escola secundária, até ao árduo trabalho na Nova Comédia Bracarense, inicialmente enquanto actor, mais tarde como encenador. Durante anos sentei-me na plateia, nas primeiras filas, tentando não perder o meu lugar de fã número 1 da pessoa que sempre me inspirou a crescer. Fui sonhando, fui vibrando. Cheguei até a imaginar que não era a Ana Miguel sentada naquela cadeira desconfortável, mas antes que podia ser o que quisesse, podia levantar-me e ser cantora, médica, boa amiga e até uma dama rica, como aquelas que via pisarem o palco. Assisti à transformação das pessoas que conhecia, familiares e amigos, em pessoas totalmente diferentes, encarnando personagens mirabolantes, sendo livres dentro delas para as fazer crescer, transformar, suceder nos desafios que se lhes deparavam ao longo do desenrolar da trama. Sonhava em silêncio poder ser uma dessas pessoas, ter a oportunidade de subir a um palco e encarnar uma personagem e amadurecê-la, amadurecendo com ela. O silêncio, esse, era provocado pela vergonha, pelo medo de falhar, por falta de confiança em mim mesma e acima de tudo, por medo de desiludir o maior amante de teatro de amadores que alguma vez conheci, o meu irmão.

Então, recentemente, um convite pôs fim ao meu silêncio e abriu as asas do meu sonho, permitindo que este voasse. Foi-me dirigido um convite para integrar o elenco da mais recente produção do grupo, “A Divisão”. O medo assolou-me o espírito e acompanhou-me na leitura da obra, cujo enredo me prendeu e conquistou à partida. Iniciei uma análise da personagem que deveria trabalhar e desde logo me identifiquei com ela, a Paula, sobrinha de Jonas Montenegro, jovem simples com uma enorme força e responsabilidade. A decisão de finalmente abraçar, após todos estes anos de espera, um projecto teatral chegou como resultado a uma frase que ainda hoje é fonte da força que me permite continuar um árduo trabalho – “Se não te achasse capaz, não te convidava.”. Estas palavras proferidas pelo nosso encenador entoaram na minha cabeça nos breves segundos que o meu cérebro levou a produzir a mera afirmação “Sim, aceito.”, que veio mudar a minha vida.

Hoje, após meses de ensaio, nervosismo de decorar texto, dificuldade em compreender a personagem em todas as suas particularidades e características, ansiedade da estreia, e ansiedade acrescida de voltar a levar a palco uma produção que, humildemente digo, teve um sucesso satisfatório na estreia, agradeço a todos os meus colegas que comigo pisaram o palco (Liliana, Boss, Bafo, Lucas, Joana, Nela, Nuno e Pintas), a todos os amigos que me apoiaram com as suas palavras de força e a sua presença no momento da grande estreia, mas agradeço acima de tudo ao meu encenador, irmão e amigo, Miguel Marado, por ser um exemplo, tanto na vida como no percurso teatral.

E citando-o, na primeira publicação deste nosso cantinho, “Pensei em pensar, ao escrever este texto, mas senti que devia sentir”, despeço-me agradecendo por lerem mais um desabafo, porque, afinal de contas, não podemos separar emoções da arte de representar.


Ana Miguel Marado

Um comentário:

Joana Dias disse...

Essa força que te caracteriza é a força dos jovens de hoje..somos uma geração de lutadores pelas mais variadas razões...e melhor de tudo..quase sempre conseguimos passar os obstaculos...

quanto ao termos estado na tua estreia..e penso que posso falar por todos...foi uma honra..

um beijinho e que a tua carreira de actriz nao fique por aki espero por um novo convite para um estreia...:)